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terça-feira, 15 de julho de 2014

FATOS JOGADOS PARA DEBAIXO DO TAPETE 1 (A LENDA DA DEMOCRACIA)

O Exército põe o dedo numa ferida que boa parte da esquerda sempre jogou debaixo do tapete: todos os grupos que participaram da luta armada queriam derrubar a ditadura militar para instalar uma ditadura de viés comunista ou socialista. Ninguém pensava em reconduzir ao poder o presidente deposto, João Goulart. Mas a esquerda acabou criando a lenda de que todos os grupos buscavam a democracia. 

Outra questão é o envolvimento – pequeno, mas verdadeiro – de guerrilheiros de esquerda com o terrorismo, ou seja, com ações contra a população, e não apenas o inimigo militar. 

Por fim, estão relatados casos em que militantes de esquerda foram assassinados por seus próprios companheiros, como Márcio Leite de Toledo e Carlos Alberto Maciel Cardoso, ambos da ALN (Aliança Libertadora Nacional), e Francisco Jacques Moreira de Alvarenga, da RAN (Resistência Armada Nacional). 

O justiçamento de companheiros de luta, praticado por alguns grupos, ainda hoje é um tabu para a esquerda. 





Fonte: Helio Rosa, citando parte da entrevista do jornalista Lucas de Figueiredo http://www.wirelessbrasil.org/bloco_cidadania/secoes/orvil.html)

sábado, 6 de novembro de 2010

O ESTADO MONÁRQUICO VERSUS O ESTADO REPUBLICANO

Algumas mudanças, na transição do Império para a República, estavam em andamento, tais como o regime político, o sistema eleitoral, o tipo de relação entre os poderes do Centro (Rio de Janeiro) e dos Estados, a apropriação do poder republicano pelas elites latifundiárias (cafeicultores), o desenvolvimento da cafeicultura, o crescente aumento do capital inglês no financiamento da cafeicultura, a inserção do Brasil  no mercado mundial, a passagem da economia brasileira de comercial para comercial-financeira, a valorização do capital, a abolição da escravatura, a ampliação do trabalho livre, a entrada dos imigrantes e tantas outras mudanças. Pode-se ainda acrescentar que a ideia republicana já estava embutida em vários movimentos de “rebeldia” que ocorreram: Inconfidência Mineira, Inconfidência Baiana, Revolução de 1817, Confederação do Equador e Revolução Farroupilha.

É comum, entre os historiadores, dizer que o Estado monárquico era caritativo e paternalista. A vida se processava numa relação de troca, numa negociação entre o povo e o Império, pois o Estado monárquico promovia, de certa maneira, os auxílios e amparos públicos. De um lado, serviço e lealdade, e, de outro, proteção e recompensa. Isto gerou a ideia de “mentalidade paternalista” e de “paternalismo brasileiro”, e foram construídas, por isto, figuras carismáticas, como o próprio D. Pedro II e D. Obá II. Estes, aliás, tinham as suas bases de sustentação no assim chamado paternalismo. 

Politicamente, eram excluídos os pobres, mendigos e mulheres. Estes ficavam fora da sociedade política. As elites agrárias dominavam o Império, enquanto o povo confiava no paternalismo que, no fundo, era uma forma de dominação implícita, porém, era uma forma de se conseguir alguns “direitos” e proteção numa vida sem expectativas maiores do que a subsistência.

Entretanto, o Império era um obstáculo ao crescimento dos setores dominantes, na medida que era muito centralizador. E ainda outros não se sentiam à vontade no Império, como por exemplo os operários do Estado, para redefinir suas aspirações e papel político. 

Por outro lado, com o Estado Republicano, o Brasil mudava a forma de governo sem revolucionar a sociedade. O povo continuava pobre e as elites na prosperidade. A República instaurada era ainda pouco democrática e muito conservadora, e continuava sendo o país do latifúndio e do café. Contudo, novas transformações políticas abriam caminho, ou seja, desaparecia o Poder Moderador, foi extinto o caráter vitalício do Senado, o desaparecimento da eleição baseada na renda, a extinção da nobreza de títulos, o fim dos governadores provinciais nomeados, dentre outras transformações.

Surge a segunda Constituição Brasileira (a primeira da República) em 1891, impondo a forma federativa de governo, ou seja, dá aos Estados inúmeros direitos. A Constituição instaura também o presidencialismo e o regime representativo democrático. A República nasce com uma estrutura baseada, então, no federalismo, no presidencialismo e na ampliação do regime representativo, embora, na prática, as dificuldades de um pleno funcionamento deixaram muito a desejar. Nem tudo poderia funcionar na prática, pois ainda a sociedade agrária era base e precisava sobreviver. E a inclusão de todos os grupos sociais no processo político abalaria a estrutura produtiva latifundiária, a sociedade agrária.

No mundo das ideias e das mentalidades houve alguma mudança, embora a República não produzisse correntes ideológicas próprias. Porém, as ideias puderam se difundir mais livremente. Houve, inclusive, uma nova atitude dos intelectuais perante a política, atitude esta que não foi fácil no que se refere à convivência pacífica entre a República da política e a República das letras, nos primeiros tempos. Os sentimentos e atitudes, entre as elites, também se tornaram mais livres, bem como ainda a quebra de valores antigos e tradicionais. Isto é transparente no que se refere ao aprofundamento do capitalismo que se processou na República, onde a ética era menos observada em relação à ganância e o lucro.

Temos ainda a prevenção republicana contra pobres e negros, exatamente estes que não aderiram à ideia republicana. Muitos ficaram desapontados com a República, pois pensavam que ela lhes propiciaria uma maior participação, e dentre os desapontados estavam os operários e os intelectuais. A própria população pobre, sem mais aquele Estado caritativo e paternalista, começou sozinha a se auto-administrar e a se auto-prover. Uma espécie de rede comunitária começou a se organizar na falta de incorporação das baixas camadas pela República. Isto, por si só, provocou uma quebra de valores, levando-lhes à uma busca de novos valores e capacidades criativas independentes, apesar de que ainda a cidadania lhes era praticamente negada, pois o acesso aos direitos civis, políticos e individuais era quase nulo, levando a crer que uma decepção e desânimo tomava conta nos primeiros tempos da República, o que em parte pode ser correto.

O avanço burguês era nítido por causa do capitalismo e liberalismo que avançava beneficiando uns e excluindo outros. A própria obrigação do Estado de promover os socorros públicos foi retirada da Constituição de 1891. Os diretos sociais foram até diminuídos em relação ao Império. O endurecimento do sistema republicano tolheu em muito a cidadania e estava levando a uma decepção e desencanto por parte de muitos grupos no início da República. A mudança de regime levou muitos a crerem na ampliação dos direitos dos cidadãos. Mas o contrário ocorria, e ainda os setores vitoriosos obstaculizavam a democratização. As classes médias e o proletariado urbano permaneceram sem forças diante das oligarquias rurais. Os trabalhadores rurais continuaram nas mesmas condições de vida do Império. O sistema de produção, o caráter colonial da economia e a dependência externa também não mudaram em relação ao Estado imperial. Entretanto, a população crescia, a indústria se desenvolvia, aumentava a urbanização, o proletariado e a classe média se espalhavam pela República, o que não ocorria no Império.

Enfim, o que se pode perceber é que o Império já se mostrava corroído e antiquado e não correspondente às novas realidades políticas, sociais e econômicas. A República, apesar de todos os seus problemas e interesses menos dignos, não deixava de ser uma evolução natural de um regime imperial obsoleto, num mundo de constantes transformações. Como assinala Nelson Werneck Sodré, “O Império não foi o paraíso como é apresentado a estudantes incautos. O Brasil, sob o Império, era, na verdade, uma grande fazenda escravista, mal administrada.”


Prof. Hermes Edgar Machado Jr. (Issarrar Ben Kanaan)



Referências e sugestões bibliográficas:

-“A República: uma revisão histórica”, Nelson Werneck Sodré
-“Evolução Social do Brasil”, Nelson Werneck Sodré
-“Formação Histórica do Brasil”, Nelson Werneck Sodré
-“Os Bestializados: o RJ e a República que não foi”, José Murilo de Carvalho
-“Viva a República!”, Donatello Grieco
-“O Cotidiano da República”, Sandra Jatahy Pesavento
-“História Sincera da República”, vol2, Leoncio Basbaum
-“Brasil em Perspectiva”, Carlos Guilherme Mota (org.)
-“Da Monarquia à República: momentos decisivos”, Emilia Viotti da Costa
-“História Nova da República Velha”, Joaquim J. Felizardo
-“Brasil República”, Hamilton M. Monteiro


Fonte da Gravura: Acervo de autoria pessoal


sexta-feira, 15 de outubro de 2010

O MARQUÊS DE POMBAL

16 de outubro de 1769: o Ministro Sebastião José de Carvalho e Melo, no reinado de D. José I, Rei de Portugal, recebe o título de Marquês de Pombal.


A transformação econômica do século XVIII acontecia paralelamente a uma agitação no nível das ideias. Tal agitação foi conhecida como Iluminismo filosófico, cuja missão era o impulso a uma nova visão de mundo e do homem, baseando-se no retorno à razão.

Em 1750, em Portugal, ocorria o fim do reinado absolutista de D. João V. Momento que ocorria também a transição modernizadora do Estado português. Este, um país atrasado por causa da dependência política e econômica em relação à Inglaterra, de uma imensa burocracia administrativa e de um conservadorismo mental da Igreja Católica, dentre outras causas.

Dentro dessa transição, Portugal já sentia o clima do Iluminismo e do “despotismo esclarecido”. Os “déspotas esclarecidos” eram monarcas e ministros influenciados pelo Iluminismo. O Ministro Sebastião José de Carvalho, no reinado de D. José I, é feito Marquês de Pombal. Este, um seguidor das ideias Iluministas, as mesmas dos filósofos Diderot, Lock, Hume, Voltaire, Rousseau, Montesquieu, Helvetius e outros.

O Estado português encontrava-se enfraquecido, e Pombal buscava revigorá-lo, aperfeiçoando o mercantilismo, no plano econômico, e medidas do espírito iluminista, no campo administrativo. Buscava ainda libertar o Estado da influência direta e impositiva da Igreja Católica que era quase um Estado paralelo. Para isso expulsou os jesuítas de Portugal e do Brasil, pois o ensino era dominado pela Igreja, passando, então, a ser responsabilidade do Estado. A Universidade de Coimbra, por exemplo, foi reformada dentro dos padrões iluministas. No seu ministério foi criada a Real Fazenda, o incentivo à produção do vinho e manufaturas. No Brasil colonial, Pombal estimulou a criação de usinas de beneficiamento de produtos primários destinados à exportação (arroz, couro, fumo etc.), criou novas companhias de comércio, diversificou as atividades agrícolas e artesanais. Também intensificou a opressão fiscal contra a colônia.

Durante 27 anos, Pombal, como principal ministro e homem forte do governo português, buscou reformas, atuando como um “déspota esclarecido”.

Temos, apesar das contradições, erros e interesses, um avanço cultural, social e político. Os fatos históricos, culturais, filosóficos não param no tempo. Há uma constante mudança de maneiras de pensar e ver o mundo. E o Iluminismo, aqui ilustrado na figura do Marquês de Pombal, levou sua Ilustração ou Filosofia das Luzes como um gesto alternativo a um mundo obscuro, feudal, supersticioso e repleto de tradições intocáveis.

As bases rumo à Revolução Francesa estavam prontas, e o “Antigo Regime” estava em vias de cair. O termo “Antigo Regime” (Ancien Régime) era usado para nomear a situação econômica, social e política anterior a 1789. Ou seja, o mercantilismo monopolista, o Pacto Colonial, os restos do feudalismo, e a predominância parasitária do clero e da nobreza.

O Iluminismo, na verdade, reforçou e foi reforçado pela Revolução Francesa. Suas ideias e ideais eram constantemente condenados e reprimidos pela Igreja. Impressos e livros (Enciclopédia) eram constantemente queimados. Entretanto, graças a diversos “clubes de ideias ilustradas” e à Maçonaria, os ideais iluministas continuaram a propagar-se.

Se por um lado o Iluminismo e a Revolução Francesa exageraram em alguns aspectos, ou deram muita ênfase ao racional e a busca de uma liberdade sem limites ou sem responsabilidade em alguns setores, como o econômico, por outro lado o atraso, a ignorância, o luxo desenfreado, os abusos do clero e da nobreza, a situação miserável e escrava das classes trabalhadoras eram insuportáveis.

Assim, o mundo via pela primeira vez algumas mudanças substanciais em diversos setores: nas questões jurídicas, pois começava a garantia legal dos direitos e deveres dos cidadãos; no “esclarecimento” que difundia-se em vários países europeus e americanos; na criação das bases ideológicas da Revolução Francesa e independência das colônias americanas; na educação, cultura e ciências; e na limitação do poder político da Igreja.

O mundo estava precisando de um pouco de Razão e Progresso; de Liberdade, Igualdade e Fraternidade. Os povos precisavam dar oportunidade à razão que há muito estava sufocada pela intolerância religiosa prepotente.

E o certo é que o progresso do homem só será garantido através do livre exercício de suas faculdades, a partir da liberdade de pensar.


Prof. Hermes Edgar Machado Jr. (Issarrar Ben Kanaan)



Referências e sugestões bibliográficas:

- “O Brasil em Perspectiva”, Carlos Guilherme Mota (org.)

- “Síntese de História da Cultura Brasileira”, Nelson Werneck Sodré

- “A Etiqueta no Antigo Regime: do sangue à doce vida”, Renato Janine Ribeiro

- “O Sistema Colonial”, José Roberto do Amaral Lapa

- “História do Brasil Colonial”, Luiz Roberto Lopez

- “O Iluminismo e os Reis Filósofos”, Luiz R. Salinas Fortes

- “As Grandes Correntes do Pensamento”, Voltaire Schilling

- “A Era das Revoluções”, Eric J. Hobsbawm




Fonte da Gravura: Acervo de autoria pessoal

quinta-feira, 16 de setembro de 2010

RIO GRANDE DO SUL: FRONTEIRA ENTRE DUAS FORMAÇÕES HISTÓRICAS

Diferentemente do Norte e do Oeste brasileiro, que na formação histórica do Brasil eram quase nulos em termos econômicos e sociais, o Rio Grande do Sul, como uma fronteira entre duas formações históricas, teve um papel social e político considerável no que se refere à guerra, ao militarismo e à ditadura.

Quais foram, assim, as relações entre a sociedade do Rio Grande do Sul com a guerra, com o militarismo e com a ditadura?

É conhecido o fato de que a Província, o Rio Grande do Sul, caracterizou-se diferente do resto do Brasil no que se refere à sua formação histórica, pois era a verdadeira fronteira do Império do Brasil com as Repúblicas Hispanoamericanas e que rivalizavam política, militar e economicamente com o Brasil. Verdadeira fronteira porque já havia atividade política, social e econômica, ao contrário do Norte e do Oeste brasileiro que estava ainda em vias de ser “desbravado”.

Juntamente com tal rivalização ocorria ainda a rebelação dos pecuaristas contra o Império brasileiro (Revolução Farroupilha) e o conflito entre classes dominantes regionais (pecuaristas e charqueadores), pois o centro subordinava as periferias em todas as instâncias (política, econômica, militar etc.). Um verdadeiro conflito de interesses dentro da Província (entre elites) e desta com o Império.

O militarismo do Império pesava na Província. Eram muitos recrutamentos, danos de guerra e ainda o constrangedor fato de que quase somente portugueses poderiam ser oficiais. Isto causava um certo desconforto na Província sulista. Um verdadeiro descaso do Império se verificava, e a Província parecia ser vista apenas como uma fonte de renda (impostos) e como um centro militar para a defesa do Império em relação ao Prata e suas ameaças.

Então, a partir da fronteira em guerra, do peso e dos danos militares, da produção pecuária, dos mercados dos seus produtos, dos impostos, da concorrência e da posição que os latifundiários pecuaristas ocupavam em relação a outros grandes proprietários do Império, estabelecia-se uma relação que oscilava na complementaridade, na dependência e na oposição em relação ao Império.

Outro aspecto relevante foi o projeto de criação de áreas de pequenas propriedades no Rio Grande do Sul que acabou transformando a sociedade gaúcha e favorecendo uma diversificação social. Era uma nova experiência produtiva e administrativa que marcava o Sul.

Não pode ser esquecido também que o Rio Grande do Sul, com o Partido Republicano Riograndense (PRR), estabeleceu laços estreitos com o exército nacional, sendo que este partido tornou-se o primeiro partido político moderno do Brasil e realizou, em nível regional, uma longa experiência ditatorial. O PRR foi considerado o primeiro partido moderno do Brasil pois abrigava ideais republicanos e positivistas com suas metas visando o social, a segurança do Estado e do indivíduo.

Vemos, portanto, que a formação histórica sulista possui uma relação fundamental com a guerra, com a ditadura e com o militarismo porque as estruturas fundiárias, sociais e políticas resultaram de uma fronteira em constante estado de alerta ou de guerra; de classes rurais proprietárias, mas geralmente divididas; de experiência com pequenas áreas de propriedade; de diversificações sociais em relação à sociedade brasileira; de um partido político moderno; e do exercício da ditadura.

Através destas tensões e opressões, destes conflitos entre as elites locais e a opressora Corte, o Rio Grande do Sul se fazia palco de experiências sociais e políticas, sendo “sui generis” em relação ao restante do Brasil.


Prof. Hermes Edgar Machado Jr. (Issarrar Ben Kanaan)




Referências bibliográficas e aprofundamento:

-TARGA, Luiz Roberto P. O Rio Grande do Sul: fronteira entre duas formações históricas. In: TARGA, Luiz Roberto P. (org.). Gaúchos & Paulistas – Dez Escritos de História Regional Comparada. Porto Alegre: FEE, 1997.

-PESAVENTO, Sandra Jatahy. A Revolução Farroupilha. 3ª ed., São Paulo: Editora Brasiliense, 1990.



Fonte da Gravura: Acervo de autoria pessoal

segunda-feira, 13 de setembro de 2010

O MITO DO GAÚCHO

O mundo tem demonstrado, através dos tempos, uma necessidade de criação de mitos relacionados a temas religiosos, a processos de resgatar “imagens perdidas” e aspirações diversas. A sociedade, praticamente sem se interrogar e questionar sobre a significação dos seus mitos, absorve signos, símbolos e estereótipos.

Levando-se em conta que um mito pode representar uma compensação, servir como substituto de uma realidade não aceita, ou ainda forjar um interesse, seria possível, no caso do estereótipo do gaúcho, enquadrá-lo como um mito?

Há casos de mitos que existem sem que possamos precisar sua origem, pois sua formação não é intencional. Neste caso, nunca houve a intenção inicial de se criar um mito, sendo a sociedade, o tempo e o inconsciente coletivo os responsáveis pelo processo natural e gradativo da criação. Entretanto, há casos de mitos programados antecipadamente, ou seja, a mitificação artificial de coisas e pessoas com fins de conquistar a sociedade para interesses econômicos, políticos e sociais.

No caso do gaúcho, com o passar do tempo, muitas modificações no modo de viver foram observadas. Todas decorrentes das mudanças ocorridas no setor econômico, tais como o crescimento agrícola e industrial e a diminuição da atividade pastoril, esta a mais característica do gaúcho. Assim, o substrato que sustentava o gaúcho “tradicional”, e que o promovia, ruiu. O romantizado e bravo gaúcho teve de enfrentar outra realidade social e econômica.

A partir de então, como um mecanismo de defesa, representantes de ideologias rurais e de identidades culturais feridas passaram a ver e propagar o gaúcho com características míticas e heróicas dos “bons tempos” passados como discurso para sua sobrevivência.

Em suma, se considerarmos como verdadeiro que haja um mecanismo de defesa dos representantes de interesses ideológicos e saudosistas, e como também verdadeiro que haja uma defesa dos “bons tempos” como substituto de uma realidade atual não aceita, pode-se dizer que o estereótipo do gaúcho é enquadrável como um mito. Um caso típico de mito forjado e programado artificialmente com o intuito de conquistar uma sociedade, que absorve símbolos sem questionamentos, para tentar justificar determinados interesses econômicos, políticos e sociais em processo de extinção.


Prof. Hermes Edgar Machado Jr. (Issarrar Ben Kanaan)



Referências e sugestões bibliográficas:

- “Nós, os Gaúchos”, Sergius Gonzaga e Luis A. Fischer (coord.), Ed. da Universidade

- “O Gaúcho”, Carlos Reverbel, Ed. LPM

- “RS: Cultura & Ideologia”, José H. Dacanal e Sergius Gonzaga (coord.), Ed. Mercado Aberto

- “Modelo Político dos Farrapos”, Moacir Flores, Ed. Mercado Aberto

- “Origem e Evolução da Ideologia”, Otto Alcides Ohlweiler, Ed. da Universidade

- “Sociologia Geral”, Eva Maria Lakatos, Ed. Atlas

- “O Gaúcho a Pé”, (um processo de desmitificação), Elizabeth R. Lara, Ed. Movimento e FISC

- “História do Rio Grande do Sul”, Danilo Lazzarotto, Ed. UNIJUI

- “Rio Grande do Sul: 4 Séculos de História”, Júlio Quevedo (org.), Martins Livreiro Editor

- “O Homem e seus Símbolos”, Carl G. Jung, Ed. Nova Fronteira

- “Convite à Filosofia”, Marilena Chaui, Ed. Ática



Fonte da Gravura: Acervo de autoria pessoal