quinta-feira, 28 de outubro de 2010

CAUSAS DA PROCLAMAÇÃO DA REPÚBLICA

Podemos dizer que o fim do governo de D. Pedro II foi marcado por uma série de contestações ao regime imperial. Contestações tendo por base a campanha abolicionista, a “questão religiosa”, a “questão militar”, a insatisfação da oligarquia cafeeira, a insatisfação das elites dos setores produtivos das províncias e as transformações sociais e econômicas a partir da Revolução Industrial. Tudo isto demonstrava os efeitos da realidade que estava sendo vivida na época, ou seja, efeitos advindos dos conflitos e mudanças  nas áreas econômicas, políticas e sociais que se difundiam a partir da Europa. Mas, o que realmente movia o Império rumo à República?

A oligarquia cafeeira do Oeste paulista, que integrou o movimento republicano, tornou-se a maior concentradora de poder econômico no Império. Ocupou terras férteis, utilizou o trabalho livre e técnicas mais avançadas no beneficiamento do café. Esse grupo de fazendeiros não dependia do trabalho escravo. Entretanto, não tinha muita influência no sistema político, embora tivesse poder econômico. No final do século XIX, essa elite já não concordava com a política centralizadora do Império. Então, a alternativa republicana já começava a ser vista como único caminho viável para chegar ao poder e acabar com a centralização do Império. Viam, então, para isso, a implantação de uma república federalista. Assim, no decorrer da segunda metade do século XIX, o movimento republicano obteve o apoio da elite cafeeira do Oeste paulista, que o tornou mais influente e poderoso. O Império, que já não tinha o apoio dos setores urbanos, não pode mais contar também com o apoio das elites cafeeiras.

A ideia do federalismo, na questão dos ideais republicanos, deveu-se também à insatisfação das elites de setores produtivos das províncias quanto a sua importância pouco expressiva diante dos interesses do Império no Rio de Janeiro. Insatisfeitos porque encontravam-se afastados das decisões tanto centrais quanto de seus próprios interesses provinciais, pois o Império vivia em torno do Rio de Janeiro. Mais uma fatia, então, começava a se associar aos princípios do republicanismo, por descontentamento.

Perdeu ainda, o Império, o apoio da Igreja (Questão Religiosa). A “questão religiosa” era originada nos atritos entre o alto clero e o governo imperial. Ou seja, o Papa ordenava punições aos religiosos maçons, entretanto, participavam da maçonaria diversos padres, importantes políticos e também elites econômicas. Seguindo orientação papal, os bispos começaram a punir os padres maçons. D. Pedro II, por outro lado, anulava as punições, e uma situação e relacionamento difícil se estabelecia entre a Igreja e o Império. A partir de então, muitos elementos do clero se uniram aos ideais republicanos, pois estes pregavam a separação entre a Igreja e o Estado.

Outro fator que fez o Império perder apoio, foi o descontentamento dos militares (Questão Militar).  A “questão militar” começou com a conscientização, pelos militares, de sua importância. Isso começou depois da Guerra do Paraguai. Antes, os militares eram considerados em segundo plano diante dos civis. A partir de então, os militares começaram a manifestar insatisfação pelo tratamento que recebiam do Império. Com a liderança de Benjamin Constant, que era partidário dos ideais republicanos e positivistas, um grupo de oficiais começava a tornar público as insatisfações militares e juntou-se às causas republicanas. Muitos incidentes ocorriam entre o Império e os militares, pois a estes era proibido qualquer pronunciamento público. Os incidentes acabaram envolvendo chefes militares importantes como o Visconde de Pelotas e o Marechal Deodoro da Fonseca. Tudo isso ia favorecendo a difusão do ideal republicano, agora também já no meio militar.

Estas duas Questões, não sendo exatamente fatores desencadeantes da Proclamação da República, foram demonstrativos ou efeitos do descompasso entre o Poder Civil e o Religioso, no caso da Questão Religiosa; e animosidades entre as Forças Armadas e o imperador, pelo tratamento do governo, o que facilitou a difusão das ideias republicanas e a influência do Positivismo, no caso da Questão Militar.

O Império também apoiava-se na escravidão e, portanto, tinha o apoio dos escravistas. Mas a pressão do abolicionismo foi mais forte e o Império cedeu. Com a Abolição, os tradicionalistas e os escravistas (senhores de engenho do Nordeste e cafeicultores do Vale do Paraíba), que eram fazendeiros, sentiram-se traídos pelo governo imperial e deixaram também de apoiá-lo. A crise da escravidão iniciou-se com o fim do tráfico e foi acelerada pelo crescimento da luta abolicionista, pela imigração e pela elevação dos custos do trabalho escravo. Praticamente todos os cargos importantes do Império estavam nas mãos da tradicional e decadente classe de grandes proprietários escravistas, que queriam preservar a escravidão e o sistema político centralizador do Império. A abolição, para eles, como já me referi acima, foi uma traição.

Transformações econômicas, políticas, culturais e sociais, já vinham ocorrendo no mundo por conta da Revolução Francesa e da Revolução Industrial.  Desta última somam-se ainda as novas condições econômicas onde a agricultura já não era a única fonte de produção, pois começavam a surgir indústrias, organizações de crédito e ferrovias para o melhor transporte da produção. A crise escravista, a mão de obra imigrante e as novas técnicas de produção econômicas reforçaram, portanto, nas novas configurações das mudanças que estavam prestes a ocorrer.

Grupos sociais novos surgem a partir do crescimento da população urbana mais pobre. Surgem os operários, a burguesia e os trabalhadores de indústrias. E isto traz um choque de tradições e culturas, novos métodos de produção no campo, novas tecnologias, conflitos entre o poder político e o poder econômico e ainda novas aspirações que permeavam as mentalidades.

No turbilhão de todos estes conflitos, contradições e jogo de interesses, enfraqueceram-se as oligarquias tradicionais e o próprio Império, favorecendo e fortalecendo o movimento republicano e a consequente Proclamação da República.

Então, podemos ainda perguntar: a República foi uma “revolução” ou uma “evolução natural do Império”? Sabe-se que os republicanos não eram a favor de uma revolução sangrenta. E Quintino Bocaiúva, Benjamin Constant e outros eram declaradamente adeptos de uma evolução natural do Império à República, segundo as suas crenças positivistas, ou seja, uma lei na história chamada de “inevitabilidade evolutiva natural”.

Mas a Proclamação da República concretizou-se após fracassadas tentativas políticas e um clima de tensão. Os militares foram chamados, e o Marechal Deodoro da Fonseca, reunido com Rui Barbosa, Benjamin Constant, Aristides Lobo, Quintino Bocaiúva, Francisco Glicério, Cel. Solon Ribeiro, dentre outros, aceitou a proposta de depor o Império e, em 15 de novembro de 1889, levou a cabo a Proclamação da República. As tropas do exército cercavam o Ministério da Guerra, pelo lado militar, enquanto pelo lado civil, Silva Jardim, José do Patrocínio e Lopes Trovão organizavam um ato público em frente à Câmara Municipal, pedindo o fim da monarquia e o início do novo regime republicano.

Enfim, podemos dizer que a República foi proclamada por um grupo que era, no fundo, contra a República. Porém, como um último recurso, viam na Proclamação da República, que pode ser chamada de “golpe”, a oportunidade dar continuidade a seus interesses políticos e econômicos. Este grupo, ou seja, a classe dominante do Império, economicamente falando, sentindo-se sem poderes políticos para que pudesse administrar em prol de seus próprios interesses, e mesmo com uma aberta contradição entre o poder político e o poder econômico, lançou as bases essenciais ao “golpe da República”. Mesmo a contra-gosto, entenderam que somente o ideal federalista e a República poderiam solucionar seus interesses.

Assim, a República foi proclamada, em essência, para favorecer aos grandes proprietários. Uma república que foi proclamada sem a participação do povo (escravos e classes pobres). Este povo, excluído da sociedade, apenas assistia “bestializado”, e à margem, a “parada militar” e o “palco teatral republicano” (conforme as palavras do historiador José Murilo de Carvalho). Por outro lado, também cabe incluir, que não deixou de ter uma inspiração na evolução natural política, conforme as tendências e cenário político, social, cultural e econômico mundial da época (Positivismo, Iluminismo, dentre outros).


Prof. Hermes Edgar Machado Junior (Issarrar Ben Kanaan)



Referências e sugestões bibliográficas:

-“Brasil: síntese da evolução social”, Aluysio Sampaio
-“Da Monarquia à República: momentos decisivos”, Emilia Viotti da Costa
-“Formação Histórica do Brasil”, Nelson Weneck Sodré
-“Brasil em Perspectiva”, Carlos Guilherme Mota (org.)
-“Viva a República!”, Donatello Grieco
-“Os Bestializados: o RJ e a República que não foi”, José Murilo de Carvalho


Fonte da Imagem: Acervo de autoria pessoal

sexta-feira, 15 de outubro de 2010

O MARQUÊS DE POMBAL

16 de outubro de 1769: o Ministro Sebastião José de Carvalho e Melo, no reinado de D. José I, Rei de Portugal, recebe o título de Marquês de Pombal.


A transformação econômica do século XVIII acontecia paralelamente a uma agitação no nível das ideias. Tal agitação foi conhecida como Iluminismo filosófico, cuja missão era o impulso a uma nova visão de mundo e do homem, baseando-se no retorno à razão.

Em 1750, em Portugal, ocorria o fim do reinado absolutista de D. João V. Momento que ocorria também a transição modernizadora do Estado português. Este, um país atrasado por causa da dependência política e econômica em relação à Inglaterra, de uma imensa burocracia administrativa e de um conservadorismo mental da Igreja Católica, dentre outras causas.

Dentro dessa transição, Portugal já sentia o clima do Iluminismo e do “despotismo esclarecido”. Os “déspotas esclarecidos” eram monarcas e ministros influenciados pelo Iluminismo. O Ministro Sebastião José de Carvalho, no reinado de D. José I, é feito Marquês de Pombal. Este, um seguidor das ideias Iluministas, as mesmas dos filósofos Diderot, Lock, Hume, Voltaire, Rousseau, Montesquieu, Helvetius e outros.

O Estado português encontrava-se enfraquecido, e Pombal buscava revigorá-lo, aperfeiçoando o mercantilismo, no plano econômico, e medidas do espírito iluminista, no campo administrativo. Buscava ainda libertar o Estado da influência direta e impositiva da Igreja Católica que era quase um Estado paralelo. Para isso expulsou os jesuítas de Portugal e do Brasil, pois o ensino era dominado pela Igreja, passando, então, a ser responsabilidade do Estado. A Universidade de Coimbra, por exemplo, foi reformada dentro dos padrões iluministas. No seu ministério foi criada a Real Fazenda, o incentivo à produção do vinho e manufaturas. No Brasil colonial, Pombal estimulou a criação de usinas de beneficiamento de produtos primários destinados à exportação (arroz, couro, fumo etc.), criou novas companhias de comércio, diversificou as atividades agrícolas e artesanais. Também intensificou a opressão fiscal contra a colônia.

Durante 27 anos, Pombal, como principal ministro e homem forte do governo português, buscou reformas, atuando como um “déspota esclarecido”.

Temos, apesar das contradições, erros e interesses, um avanço cultural, social e político. Os fatos históricos, culturais, filosóficos não param no tempo. Há uma constante mudança de maneiras de pensar e ver o mundo. E o Iluminismo, aqui ilustrado na figura do Marquês de Pombal, levou sua Ilustração ou Filosofia das Luzes como um gesto alternativo a um mundo obscuro, feudal, supersticioso e repleto de tradições intocáveis.

As bases rumo à Revolução Francesa estavam prontas, e o “Antigo Regime” estava em vias de cair. O termo “Antigo Regime” (Ancien Régime) era usado para nomear a situação econômica, social e política anterior a 1789. Ou seja, o mercantilismo monopolista, o Pacto Colonial, os restos do feudalismo, e a predominância parasitária do clero e da nobreza.

O Iluminismo, na verdade, reforçou e foi reforçado pela Revolução Francesa. Suas ideias e ideais eram constantemente condenados e reprimidos pela Igreja. Impressos e livros (Enciclopédia) eram constantemente queimados. Entretanto, graças a diversos “clubes de ideias ilustradas” e à Maçonaria, os ideais iluministas continuaram a propagar-se.

Se por um lado o Iluminismo e a Revolução Francesa exageraram em alguns aspectos, ou deram muita ênfase ao racional e a busca de uma liberdade sem limites ou sem responsabilidade em alguns setores, como o econômico, por outro lado o atraso, a ignorância, o luxo desenfreado, os abusos do clero e da nobreza, a situação miserável e escrava das classes trabalhadoras eram insuportáveis.

Assim, o mundo via pela primeira vez algumas mudanças substanciais em diversos setores: nas questões jurídicas, pois começava a garantia legal dos direitos e deveres dos cidadãos; no “esclarecimento” que difundia-se em vários países europeus e americanos; na criação das bases ideológicas da Revolução Francesa e independência das colônias americanas; na educação, cultura e ciências; e na limitação do poder político da Igreja.

O mundo estava precisando de um pouco de Razão e Progresso; de Liberdade, Igualdade e Fraternidade. Os povos precisavam dar oportunidade à razão que há muito estava sufocada pela intolerância religiosa prepotente.

E o certo é que o progresso do homem só será garantido através do livre exercício de suas faculdades, a partir da liberdade de pensar.


Prof. Hermes Edgar Machado Jr. (Issarrar Ben Kanaan)



Referências e sugestões bibliográficas:

- “O Brasil em Perspectiva”, Carlos Guilherme Mota (org.)

- “Síntese de História da Cultura Brasileira”, Nelson Werneck Sodré

- “A Etiqueta no Antigo Regime: do sangue à doce vida”, Renato Janine Ribeiro

- “O Sistema Colonial”, José Roberto do Amaral Lapa

- “História do Brasil Colonial”, Luiz Roberto Lopez

- “O Iluminismo e os Reis Filósofos”, Luiz R. Salinas Fortes

- “As Grandes Correntes do Pensamento”, Voltaire Schilling

- “A Era das Revoluções”, Eric J. Hobsbawm




Fonte da Gravura: Acervo de autoria pessoal