terça-feira, 14 de setembro de 2010

GUERRA DOS FARROUPILHAS: A ECONOMIA REGIONAL GAÚCHA E O LIBERALISMO ECONÔMICO

O Rio Grande do Sul surgia e se desenvolvia no instante em que o mundo rompia as grandes barreiras de ordem feudal e iniciava a Idade Contemporânea. Havia, por toda a parte, um florescimento de ideias contrárias às que predominavam nos tempos medievais. Surgiam novas doutrinas e ideias que, em cada lugar onde alcançavam, tomavam formas e matizes diferentes, de acordo com exigências, interesses e relacionamentos locais, nacionais e internacionais. Daí que se pode perguntar, considerando-se o Rio Grande do Sul, no tempo da “Guerra dos Farroupilhas”, qual a relação que motivava essas exigências, relacionamentos e interesses locais.

Ganhava terreno a doutrina liberal iluminista, onde as leis e as Constituições deveriam ser respeitadas por todos, inclusive pelas classes dirigentes, para que a liberdade, a igualdade e a fraternidade fossem garantidas. Dentro desta ideia também surgia o ideal de federação, ou seja, a descentralização do poder que garantiria a autonomia das províncias, de eleições dos seus governantes e de que impostos recolhidos ficassem no local do recolhimento. Contudo, no Brasil, mesmo que a Independência tenha recebido impulsos do liberalismo, continuou o Estado sendo centralizador e totalitário.

O Rio Grande do Sul, por sua vez, promovia por alguns setores, como a imprensa, dentre outros, o liberalismo republicano e federalista. Há autores que afirmam ter havido influência de ideias republicanas oriundas dos países vizinhos do Prata. Alguns chefes liberais gaúchos, como Bento Gonçalves, por isso, foram acusados de separatistas.

Por um lado, as guerras e o sistema militar do Império desagradavam pelo seu imposto despotismo e oneroso peso sobre a Província. Por outro lado, o principal produto da Província, o charque, tornava-se difícil de concorrer com o produzido no Prata, por dois motivos: pesados impostos que o Império taxava e o sistema produtivo escravista que tornava menos eficaz a produção.

Ainda no Sul, o clero, a maçonaria e as sociedades literárias apoiavam as ideias liberais, republicanas e federativas. O federalismo era necessário e vantajoso para as classes dominantes, pois significava a liberdade econômica em relação ao Império.

Tudo isto ia, aos poucos, somando-se e impregnando a Província de ideias federativas como forma de escapar do estrangulamento político, da condição de periferia e do bloqueio econômico exercido pelas elites do centro do Império.

Observa-se, assim, que a “Guerra” ou “Revolta” dos Farroupilhas foi uma luta pelos princípios liberais e contra o centralismo e o autoritarismo do governo central, ou seja, uma luta entre um grupo oligárquico “gaúcho” contra a administração imperial. Contradições entre o centro e a periferia fizeram, então, eclodir a “Guerra” dos Farroupilhas. Na verdade, um confronto entre as elites do Sul contra as elites do centro imperial. Estas, beneficiárias da Independência, buscavam supremacia e domínio sobre aquelas.

Deste modo, podemos dizer que exigências de mercados, de ascensão da burguesia ou elite local, de poder econômico e de liberdade comercial, inspirados e adaptados do capitalismo e liberalismo econômico, que se alastrava pelo mundo, levou as elites locais a atividades de descontentamento em relação ao Império.

Fica claro, portanto, que há uma relação onde praticamente todas as exigências se inter relacionam, e esta relação está no jogo das questões nacionais e internacionais da época, ou seja, do liberalismo econômico e político que estava fazendo ruir estruturas antigas, tais como o monopólio, o absolutismo e o autoritarismo centralizador. E o “Movimento” Farroupilha, por sua vez, fazia parte dessas exigências locais inseridas nesse jogo das questões e exigências nacionais e internacionais da época.

O constitucionalismo estava tomando força. Entretanto, na formação do Estado Nacional brasileiro, a centralização e o autoritarismo, contrários à doutrina liberal, ainda persistiam, desrespeitando o regional.

Assim, a Província “gaúcha”, tocada pelo liberalismo, agitava-se semelhante à Europa, à América e ao Brasil. Cada uma à sua maneira, ótica e interesses específicos e particulares.


Prof. Hermes Edgar Machado Jr. (Issarrar Ben Kanaan)



Fonte da Gravura: Acervo de autoria pessoal



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